Quando se usa um Multímetro Digital (DMM – Digital Multimeter) é importante saber como as medidas são realizadas, se os valores lidos são de pico, médios, rms ou outro. Se você tem dúvidas sobre o que o instrumento está indicando, problemas podem ocorrer quando você precisar de medidas rms. A Agilent Technologies tem um excelente documento que analisa este problema e que nos serviu de base para preparar este artigo. A abordagem é justamente feita no sentido de ajudar o profissional, principalmente da indústria, que precisa ter medidas certas de tensões rms, de modo a poder avaliar se a qualidade da energia que chega a um equipamento está de acordo com o esperado e não é a responsável por eventuais problemas que possam estar ocorrendo.

Temos ressaltado em diversos artigos que a medida de tensões com formas de onda senoidais não é tão simples como parece.

A medida de valores rms, além de crítica pode levar a falsas avaliações se não for feita corretamente.

É importante relembrar que a medida de valores rms é a única medida que não depende da forma de onda do sinal.

Assim, rms é definida como a medida do aquecimento de equivalente, com um relacionamento com a potência dissipada numa carga resistiva com o valor contínuo equivalente.

Por exemplo, uma tensão de 1 V de pico senoidal, entrega a mesma potência numa carga resistiva que uma tensão contínua de 0,707 V, conforme mostra a figura 1.

 


 

 

 Isso significa que uma leitura confiável de um valor rms nos dá uma idéia muito melhor do efeito que essa tensão vai ter no circuito.

Na figura 2 mostramos os 4 parâmetros principais de tensão para uma forma de onda senoidal.

 


 

 

 Observe que, para uma forma de onda senoidal, o semiciclo negativo cancela o semiciclo positivo, o que significa que um valor médio não teria significado.

 Assim, a indicação média (avg – average) é baseada no valor absoluto da forma de onda, para a maioria dos instrumentos. A figura 3 mostra como isso é feito para o valor médio.

 


 

 

 O valor rms é obtido elevando-se ao quadrado o valor de cada ponto na forma de onda, encontrando depois a média (mean) dos valores através da extração da raiz quadrada (square root).

Para as formas de onda senoidais, o valor obtido corresponde a 0,707 do valor de pico ou 1,11 do valor médio.

Para as formas de onda senoidais os procedimentos de cálculo descritos funcionam perfeitamente. No entanto, se a forma de onda for outro podemos ter problemas.

Usando um multímetro que não tenha sido projetado para operar com outras formas de onda, erros significantes, de até mais de 40% podem ocorrer.

Podemos tomar como exemplo a relação entre Vp e Vrms (tensão de pico e tensão eficaz), conhecida como “fator de crista”.

A medida precisa dessa relação é muito importante, pois nos diz quanto mais altos que o valor rms são os picos de tensão, conforme mostra a figura 4.

 


 

 

 Em outras palavras, o fator de crista nos permite detectar transientes num sinal senoidal. Quanto maior for esse fator, mais difícil é fazer uma medida precisa.

Duas dificuldades podem ser associadas à medida do fator de crista:

A primeira está relacionada com a faixa de tensões de entrada. Se o fator de crista for muito alto, ao mesmo tempo em que os picos sobrecarregam o circuito, a medida rms cai numa faixa muito baixa em que se tem problemas de resolução, conforme mostra a figura 5.

 


 

 

 A segunda está relacionada com a quantidade de energia que a componente de alta freqüência do sinal carrega.

Normalmente um fator de crista elevado indicam a presença de mais harmônicas que podem causar problemas para os instrumentos, pois tempos diferentes passam a estar envolvidos no processo de medida.

 

Como Fazer Melhores Medições

Como proceder para usar melhor um multímetro digital na medida de tensões rms? O primeiro passo certamente será entender como um multímetro digital mede tensões rms.

 

Entenda como o DMM faz Medidas RMS

As tecnologias utilizadas pelos multímetros digitais para a medida de tensões rms são diferentes.

Assim, um primeiro passo para poder usar melhor esses instrumentos é entender qual a tecnologia usada no caso específico do seu instrumento.

Existem várias tecnologias que serão explicadas a seguir. As três primeiras convertem AC em DC enquanto que a última digitaliza a o sinal analógico de entrada e depois calcula o valor rms.

 

Conversores AC/DC Térmicos

Esta tecnologia antiga utiliza a abordagem térmica que define o valor rms.

O sinal de entrada aquece um par termoelétrico e um circuito do multímetro lê a tensão gerada.

A principal vantagem desta tecnologia está na capacidade de manusear fatores de crista muito altos, o que leva uma possibilidade de manusear uma faixa muito grande de sinais do mundo real.

A desvantagem está no custo e na velocidade de resposta. Esta tecnologia, por essas desvantagens não é empregada nas últimas gerações de DMMs.

Para a medida de sinais que tenham uma faixa muito ampla de freqüências e fatores de cristal altos, será interessante procurar um DMM mais antigo que use esta tecnologia.

 

Conversores Pico e Média AC para DC

Instrumentos de baixo custo, principalmente do tipo portátil, normalmente obtém o valor rms a partir do valor de pico ou médio. No entanto, eles devem ser alimentados por sinais senoidais puros, sem distorções.

Se for necessário realizar medidas true rms, esses instrumentos não são a melhor escolha.

 

Conversores AC-DC Analógicos

Muitos instrumentos intermediários e avançados usam uma cadeia de circuitos analógicos para computar o valor quadrático, a média e depois a raiz quadrada de modo a se obter uma indicação true rms praticamente para qualquer tipo de sinal.

Usando circuitos com elevado grau de integração, esses DMMs são pequenos, precisos e de custo acessível.

 

Amostragem Digital

Trata-se de um método semelhante ao encontrados em osciloscópios digitais. Cria-se um conjunto de dados correspondentes a pontos da senóide.

Os valores das amostragens são processados por um algoritmo rms.

A figura 6 mostra um processo de amostragem contínua. Cada passo de amostragem tem um pequeno intervalo, obtendo-se assim um sinal que pode ser digitalizado com grande precisão.

 


 

 

 

Essa técnica possui diversas vantagens. Por exemplo sinais true rms numa ampla faixa de formas de onda e freqüências podem ser medidos.

Além disso, é possível trabalhar com taxas de amostragens rápidas mesmo com conversores de menor velocidade.

Uma desvantagem está necessidade dos sinais medidos serem repetitivos.

 

Como o Sinal Afeta a Medida

Se analisarmos um sinal senoidal, vemos que o fator de crista é de 1,414 e um instrumento que responda aos picos pode ser preciso na sua medida.

Um sinal que tenha um pico de 500 mV terá um valor rms entre 350 e 357 mV (considera-se a precisão de acordo com a faixa utilizada).

O valor correto seria 353,53 mV. Um multímetro de baixo custo vai fornecer uma leitura um pouco abaixo desse valor real.

No entanto, se tivermos um sinal triangular, como o mostrado na figura 7, a componente de alta freqüência é maior e o fator de crista também é maior com um valor de 1,732.

 


 

 

 

Dividindo o valor de pico pelo fato de crista, temos um valor rms esperado de 290 mV.

Um multímetro que vá trabalhar com este sinal, tendo de ler 276 mV vai encontrar problemas.

O erro será de 4%, quando comparado com um multímetro true rms que terá uma leitura de 288,68 mV.

Um problema maior ocorre com um trem de pulsos onde o fator de crista depende do ciclo ativo.

A fórmula dada a seguir fornece uma aproximação do fator de crista para este tipo de sinal:

 

 
 

 

 

Isso significa que o trem de pulsos representado na figura 8, que tem um ciclo ativo de apenas 2% tem um fator de crista que corresponde à raiz quadrada de 50 ou 7,071.

 


 

 

 

A computação do valor rms para um trem de pulsos é entretanto mais complicada, sendo dada pela fórmula:

 

 

 

Usando esta fórmula encontramos o valor teórico para o valor rms de um trem de pulsos com 2 V de amplitude e ciclo ativo de 2%: 280 mV.

Um multímetro true rms vai ler um valor de 275,9 mV , o que está bem próximo do rel. No entanto, um multímetro que responda ao valor médio vai ler apenas 73 mV, o que corresponde a um erro de 74%.

Esse é um exemplo extremo, mas mostra claramente o que ocorre quando fatores de crista muito altos entram em jogo numa medida usando um multímetro.

Um outro caso é o que corresponde a uma forma de onda como a mostrada na figura 9.

 


 

 

 

O valor true rms tomado com um multímetro para esse exemplo é de 348,99 mV, o que está bem próximo do valor obtido com um osciloscópio que é de 345 mV.

No entanto, um multímetro comum lerá um valor de 273 mV, o que significa um erro de mais de 20%.

Esse erro deve-se principalmente a faixa de resposta limitada do instrumento. O sinal contém energia de alta freqüência que o multímetro comum não responde.

 

As Armadilhas

É muito importante que, ao fazer uma medida rms num circuito, a leitura imediata logo o leve a imaginar que existe algo com o circuito.

Antes, verifique se a medida que está sendo feito está realmente correta.

Diversas pequenas “armadilhas”, indicadas pela Agilent, mostram que, quem pode estar errado é o multímetro.

 

Medidas Abaixo do Fundo de Escala

Muitos multímetros especificam os sua precisão para valores acima de 5% ou 10% da plena escala.

Os melhores apenas chegam a 1%. Isso significa que as medidas que estejam muito próximas do limite inferior da escala são menos precisas.

Procure sempre uma escala que proporciona uma leitura a mais próxima quanto possível do seu final.

 

Acoplamento AC e DC

 

Esse erro pode ocorre principalmente por casa da pressa.

Quando usando o multímetro acoplado em AC, um capacitor em série com a sua entrada é colocado no circuito.

Esse capacitor bloqueia a componente DC do circuito. Isso pode ser ou pode não ser desejável, dependendo do tipo de análise que está sendo feita.

Veja que em muitos casos é preciso medir a componente AC de um sinal DC e muitos multímetros podem não ter recursos para fazer isso diretamente.

 

Saturação com Sinais de Altos Fatores de Crista

Se voltarmos ao sinal retangular com 2% de ciclo ativo o que significa que o pico tem um valor 7 vezes maior que o RMS, usando uma escala baixa para ler o valor rms, o pico pode facilmente saturar o circuito.

O multímetro usado deve ser capaz de manusear esse excesso de tensão que corresponde ao pico do sinal, sem ter problemas de sobrecarga.

Quando trabalhar com sinais com altos fatores de crista é importante verificar as especificações do multímetro para verificar se ele pode manusear o excesso de sinal.

 

Erros de Largura de Faixa

Sinais ricos em harmônicos podem causar indicações erradas de valores menores nos multímetros.

Isso pode ocorre de forma mais acentuada se a harmônica mais significativa tiver uma freqüência que o multímetro não responde.

Ao analisar sinais ricos em harmônicas verifique a faixa de freqüências que o multímetro pode manusear.

 

Aquecimento

Sinais de altas tensões podem aquecer os componentes de condicionamento de sinal do multímetro, levando a desvios de comportamento que aparecem nos resultados das medidas.

Esteja atento para os limites e se acontecer uma sobrecarga, espere o multímetro esfriar antes de uma nova medida.

 

Tempo de Acomodação

Os multímetros precisam de um certo tempo que corresponde a alguns ciclos da mais baixa freqüência do sinal que está sendo medido, para se acomodar e fornecer o resultado da leitura.

Se não tiver certeza da freqüência do sinal que está sendo medido, escolha sempre um filtro que tenha o tempo mais rápido de reposta.

 

Conclusão

Apesar das medidas AC serem um tanto quanto complicada quando levamos em conta todos os fatores que podem influenciá-la, elas são absolutamente necessárias, principalmente quando se precisa analisar a qualidade da energia que alimenta equipamentos de uma indústria, de um laboratório ou de um hospital.

Pequenas alterações em valores que não podem ser detectados por um multímetro comum podem ser a causa de funcionamentos anormais desses equipamentos.

Sabendo interpretar os resultados, sabendo usar corretamente o multímetro certo, a detecção de pequenas anormalidades da energia se torna simples.

O que vimos neste artigo é uma pequena amostra de como se deve ter cuidado na escolha do multímetro correto para cada tipo de trabalho.