A detecção dos sinais de rádio usando um simples diodo ou a junção PN de um transistor hoje é absolutamente normal, quando pensamos na montagem de um rádio elementar ou mesmo um pouco mais complexo. No entanto, antes de existirem os diodos semicondutores e os transistores a coisa não era tão simples. Soluções muito interessantes para os detectores foram criadas e abordadas no livro Early Radio Wave Detectors de Vivian J. Philips em associação com o The Science Museum de Londres de 1980 (Este livro está disponível na Internet para download). Veja neste artigo algumas das soluções adotadas na época.
A ideia básica de Hertz para receber sinais de rádio, então descobertos, e utilizada na sua famosa experiência em que fez uma transmissão dentro de seu laboratório era o faiscador.
Um elo formava a antena ressonante aproximadamente na frequência do transmissor, contendo uma abertura (gap) entre duas esferas, conforme mostra a figura 1.
Um pulso emitido pelo transmissor provocava no receptor uma pequena faísca que podia ser observada em condições favoráveis, ou detectada por um galvanômetro como sugerido por Fitzgerald na figura.
A detecção do sinal também podia ser feita da forma sugerida mais tarde com o uso de um fone de ouvido, conforme mostra a figura 2 segundo Turpain.
O primeiro avanço na recepção dos sinais de rádio veio com a invenção do coesor feita pelo professor Edouard Branly.
O fenômeno da “coerência” já havia sido observado em 1835 pelo cientista P.S. Munk na Universidade de Lund e redescoberto em 1852 por S.A. Varley que o utilizou na proteção de linhas de telégrafo.
A ideia é a seguinte: duas barras de cobre oxidado quando em contato apresentam uma resistência da ordem de 80 000 Ω. No entanto, quando aplicamos uma tensão entre elas, a resistência cai para um valor tão baixo quanto 7 Ω.
A ideia do coesor é então simples: enchendo um tubinho de vidro com limalha, elas em contato apresentam o fenômeno da coerência, ou seja, uma resistência elétrica extremamente alta ou um circuito aberto.
No entanto, na presença de um sinal (uma tensão) ocorre a queda da resistência entre os grãos da limalha e com isso a resistência cai.
Se uma fonte de tensão for usada para manter as limalhas no limiar da condução, na presença do sinal, a corrente desta fonte é conduzida, produzindo um sinal, conforme mostra a figura 3.
Um receptor simples de rádio usando coesor é mostrado de forma completa na figura 4.
Neste receptor A é a antena, E é a ligação à terra, G um galvanômetro, T um tone de ouvido e V a bateria.
O potenciômetro P é ajustado para levar a tensão no coesor ao limiar.
Este mesmo princípio é usado em receptor que publicamos usando uma gilete e em outro que usamos uma esponja de aço tipo Bombril. Nos dois, a junção destes componentes funciona como um coesor ajustando a tensão do limiar da condução para a recepção dos sinais desejados (veja ART2502 e ART2536).
Baseado no mesmo princípio da barra oxidada temos um coesor inventado por Odenbach na mesma época. Uma barra de metal oxidada era apoiada em dois fios condutores.
A condução da barra em contacto com o fio mudava na presença de sinais.
A forma do coesor teve muitas variações nos anos que sucederam sua criação, cada inventor procurando melhorar o desempenho de modo a detectar sinais fracos, já que na época não existiam dispositivos ativos que pudessem amplificá-los.
Na figura 5 temos alguns coesores da época criados por conhecidos “inventores” do rádio.
Em (a) temos um coesor de Branly, em (b) um de Popov, em (c) um de Lodge e em (d) um coesor de Marconi.
O grande problema desses coesores era a imperfeição dos contactos que os tornava instáveis .
Diversas substâncias e metais foram utilizadas pelos pioneiros do rádio tais como limalha de níquel (95%), misturada com prata (5%) no caso de Marconi, extremidades de mercúrio e diversas outras combinações, revelando que naquela época muito mais do que um conhecimento teórico do que poderia ocorrer, predominava a inventividade.
Um arranjo muito interessante, mostrando toda essa inventividade foi o “coesor multiocular politônico” de Bottone, criado em 1910, mostrado na figura 6.
A ideia era aproveitar uma eventual ressonância de diversos coesores de modo que o que tivesse maior resposta ao sinal fosse o responsável pela sua condução e consequente detecção.
Nessa época as estações telegráficas sem fio já eram comuns, e pela figura do livro citado temos uma ideia do equipamento utilizado.
Detectores Eletrolíticos
Um tipo de detector que apareceu depois dos coesores e o denominado detector eletrolítico.
Como o nome sugere, estes detectores se baseiam nas propriedades elétricas de soluções eletrolíticas, sendo basicamente de dois tipos.
Um dos detectores que possuem baixa resistência na ausência de sinais e outro que possuem alta resistência na ausência de sinais.
Os que apresentam baixa resistência na ausência de sinais, aumentando essa resistência quando o sinal é detectado também foram chamados de “anti-coesores”.
Na figura 8 temos uma ilustração do detector de Pupin de 1913.
Nestes detectores também valia a inventividade variando as substâncias usadas como glicerina, água, metais em suspensão, etc.
Na figura 9 temos o “responder” um detector eletrolítico inventado por De Forest constando num recipiente com uma pasta ativa.
A figura 10 mostra um detector ácido em que os eletrodos eram de platina e chumbo. O ácido podia ser o nítrico ou o sulfúrico e uma pequena tensão de uma bateria era aplicada nos eletrodos.
Ajustando a polarização pelo potenciômetro do circuito era possível levar o circuito ao ponto de fazer a detecção de sinais de rádio captados pela antena.
Nesta época os amadores da eletrônica já podiam montar seus próprios rádios e publicações especializadas davam os primeiros projetos práticos.
Na figura 11 temos um detector electrolítico publicado num artigo para o construtor caseiro pela revista Wireless World numa edição de 1914.
Detectores Magnéticos
Estes se baseiam no fato de que a circulação de uma corrente por um fio e consequentemente por uma bobina cria um campo magnético.
A corrente é a do sinal captado e para detectar a presença do campo criado podem ser utilizados diversos artifícios.
Na figura 12 temos o detector eletrodinâmico de Pierce de 1904.
Para detectar o movimento de uma agulha imantada sob a ação do campo criado eram utilizados os mais diversos recursos ópticos como espelhos e microscópios.
A figura 13 mostra um interessante receptor onde as agulhas eram automaticamente magnetizadas de tempos em tempos. Este receptor foi criado por Fleming em 1905.
Um arranjo de detector magnético muito interessante criado na mesma época por Bouasse se baseia na histerese dos materiais magnetizáveis e é mostrado na figura 14.
A ideia era produzir um campo magnético rotativo de modo que ele interagisse com o campo magnético criado numa bobina pelo sinal captado.
O sinal transferido por indução para a bobina com o fone seria então detectado.
O interessante nisso tudo era que naquela época os motores elétricos ainda não eram usados neste tipo de aplicação e a geração do campo magnético era feita girando-se uma manivela, conforme mostra o equipamento da figura 15.
Conclusão
E ainda há mais por vir.
Antes de chegarmos aos diodos semicondutores familiares em nossos dias, diversas outras técnicas foram criadas para se detectar sinais de adio, algumas bastante curiosas.
Num próximo artigo trataremos de mais alguns detectores utilizados nos primeiros tempos do rádio como os detectores por capilaridade, os detectores térmicos e diversos outros.