Uma simples brincadeira do Professor Ventura quase leva o diretor da escola técnica à loucura. Beto e Cleto, que ajudaram na montagem do "projeto" se divertiram muito mas, essa opinião não pode ser compartilhada com os outros funcionários da escola que levaram um tremendo de um susto com o que ele aprontou! Veja nesta estória como o Professor Ventura, Beto e Cleto intalaram uma alucinação mecatrônica na Mesa do Diretor.

- Mas que bagunça! - era Dona Neide, secretária do Professor Salgado, Diretor da Escola Técnica de Eletrônica de Brederópolis, reclamando para sua companheira de serviço.

 

- Temos que dar um jeito nisso, mas como? - concordava Dona Rosa.

 

Realmente, o Professor Salgado era um homem muito eficiente e trabalhador, além de competente no seu cargo, mas tinha o péssimo hábito de deixar acumular pilhas e pilhas de documentos, revistas, jornais, cartas, tudo enfim que chegasse às suas mãos, na mesa de seu escritório. Dona Neide é quem sofria, procurando coisas que frequentemente o diretor perdia, e que em dado instante percebia que "precisava para daqui a cinco minutos"!

 

- É uma loucura! Agora ele precisa daquele relatório que eu preparei há 5 dias e não sabe onde está! Isto é sabe: está na mesa, mas "onde" é que "são elas"!

 

Já existiam até algumas piadas em torno da "organização" da mesa, dizendo que certa vez foi colocado um anúncio no jornal pedindo um "procurador" para trabalhar na escola. Alguns dias depois apareceu um "bem apessoado" advogado, com larga experiência em assuntos jurídicos, e que desejava trabalhar com as anunciadas procurações.

 

Foi aí que informaram que, na verdade, o "procurador" que eles precisavam era um "procurador de coisas" para achar documentos na mesa do diretor quando ele os perdia!...

 

Foi nesse momento de "procura", que ocorria muitas vezes ao dia, que o Professor Ventura, acompanhado de Beto e Cleto, chegou à secretaria, para tratar de assuntos de suas aulas. Ele viu a preocupação de Dona Neide. Dona Rosa foi quem explicou o que ocorria.

 

O professor coçou o queixo e comentou com as secretárias:

 

- Acho que podemos dar um jeito nisso, desde que vocês nos ajudem! Não é verdade rapazes?

 

Beto e Cleto não tinham a mínima idéia do que se passava na cabeça do Professor Ventura, mas como sabiam que em matéria de invenções ele era simplesmente o máximo, concordaram:

 

- Sim, professor!

 

Eles tinham certeza que o professor já tinha "bolado" alguma coisa e que, certamente, era para colocar na mesa do diretor!...

 

As secretárias não deram muita importância ao fato, pois achavam que, no mínimo, o Professor Ventura iria dar mais uma "bronca" no Professor Salgado, exigindo ordem na casa, digo, na mesa! Mas o que o Professor Ventura tinha em mente era algo muito maior, ou pior!

 

No laboratório com Beto e Cleto, o Professor não teve como escapar das explicações. Os rapazes não aguentavam de curiosidade!

 

- E daí professor? Conte para a "gente" o que tem em mente para colocar na mesa do Diretor!

 

- Está Bem! Está bem! Acalmem-se que eu tive uma idéia muito interessante! Vai ser uma brincadeira e tanto!...

 

Indo ao quadro negro o Professor começou a fazer um esboço de seu "projeto" e, ao mesmo tempo, explicar:

 

- Vamos colocar uma "alucinação mecatrônica" na mesa do diretor! A idéia é simples: sob o tampo da mesa vamos enrolar uma boa bobina com fio bem grosso, de modo que possa suportar uma corrente elevada e com isso produzir um campo magnético bem forte. Depois eu faço os cálculos relativos ao número de espiras e a corrente, mas por enquanto considerem que deve ser um campo suficientemente forte para transformar e mesa do diretor num enorme solenóide!

 

- Caramba! Um solenóide, mas para quê? - perguntou Cleto bastante confuso.

 

O professor não perdeu a sequência e continuou:

 

- Na mesa dele existem muitos documentos e papéis que têm clipes e grampos de metal que podem ser atraídos por campos magnéticos. Suponha que energizemos por uma fração de segundo nossa enorme bobina! O que vocês acham que acontece?

 

- Deve puxar para baixo todos os clipes e grampos dos papeis da mesa do diretor, pelo menos eu acho que é isso!... - respondeu Beto.

 

O professor levantou o dedo e continuou:

 

- Correto! Mas existe um fator a ser considerado: os grampos e clipes estão presos aos papéis e o campo não será suficientemente intenso para arrancá-los. Isso significa que a "pilha" de papéis desorganizados deve apenas, dar uma "leve abaixadinha" isto é, ela vai "mexer"!

 

Os olhos de Beto e Cleto arregalaram os olhos entendendo tudo, e riram só de imaginar a cena e a "cara do diretor" ao ver repentinamente a papelada se mexer!

 

- Ele vai pensar que "está vendo coisas" ou então que existe algum "bicho estranho" na pilha de papéis! - comentou Beto, ainda rindo.

 

- Sim, e levando em conta que já fizeram piadas de que haveriam até "dinossauros" naquela confusão, não é difícil ele se assustar e acreditar nisso!

 

O professor acalmou os dois rapazes que não se cansavam em imaginar o que podia ocorrer e continuou:

 

- Vai ser interessante porque vamos acionar "a coisa" por controle remoto e dando "soquinhos" nos momentos certos! Ele vai poder examinar a papelada à vontade, e não vai encontrar nada! Vai ficar maluco e certamente acabar colocando ordem na "papelada"!

 

- Mas, como vamos colocar a tal bobina na mesa? - perguntou Cleto.

 

- Ela pode ficar por baixo do tampo, que é de madeira e permite a "passagem" do campo.

 

A instalação do dispositivo, acionado por controle remoto, na mesa do diretor exigiu a colaboração de Dona Neide e Dona Rosa. Aproveitando a ausência do diretor durante toda uma manhã, o Professor Ventura, Beto e Cleto instalaram o equipamento. Sob a mesa do diretor ficava a enorme bobina chata presa por fita isolante. O cabo de alimentação dessa bobina passava sob o carpete e ia até a caixa de alimentação, escondida por trás de um armário onde havia uma tomada de força. Uma pequena antena recebia os sinais do controle remoto e quando o relé, bastante silencioso, fechava seus contactos, uma corrente intensa circulava pela bobina!

 

Os testes mostraram que a "coisa" funcionava!

 

- É simples, Dona Neide, todas as vezes que você apertar este botão do controle remoto, as coisas na mesa do diretor vão mexer!

 

- Será que eu sei? - respondeu a secretária pegando o controle e experimentando.

 

- Isso mesmo! - confirmou o professor Ventura, mostrando os movimentos dos papéis na mesa - Observe quando ele estiver trabalhando e sempre que notar que está   distraído, mas olhando para a mesa, aperte somente por um instante o botão! Pedimos para você porque está em posição de vê-lo diretamente através dos vidros da divisória, se bem que a visão não seja total.

 

A secretária concordou então em controlar o aparelho. O professor Ventura, Beto e Cleto, combinaram então os momentos de acionamento e pediram que Dona Neide os avisasse para que "estivessem por perto".

 

No dia seguinte, o Diretor chegou cedo ao seu escritório. Antes de sentar olhou bem para a cadeira: o Professor Paulo, coordenador de alguns cursos da Escola Técnica tinha o hábito de colar bilhetes no encosto, já que na "bagunça" da mesa, eles certamente ficariam perdidos! O Diretor não podia deixar de fazer isso, principalmente depois que, ignorando um desses recados ele teve a má surpresa de encontrar o seguinte no assento... e com uma tachinha de ponta para cima!

 

O Diretor sentou-se e iniciou mais um dia de trabalho. Dona Neide estava pronta para a ação: vendo o Diretor, ela ficou mais atenta e esperou.

 

Em dado instante, percebendo que o Diretor olhava fixamente para a mesa, mas com o pensamento distante, ela pressionou pela primeira vez o botão do controle remoto, escondido sob sua mesa.

 

A "papelada" da mesa fez então um leve movimento de "desce e sobe". O diretor teve um pequeno sobressalto, mas não se importou muito. Dona Neide, entretanto percebeu essa pequena reação e até pensou consigo mesma:

 

" - Funciona!".

 

O trabalho continuou, e alguns minutos depois, percebendo que o Diretor estava no telefone com os olhos fixos na mesa mas concentrado na conversa, apertou novamente o botão!

 

Novamente um "baixa e sobe" de alguns milímetros apenas da papelada, mas perfeitamente perceptível fizeram com que o Diretor tivesse agora um sobressalto maior!

 

" - Acho que estou vendo coisas!" - pensou então o Diretor, retirando os óculos e examinando a lente, depois de desligar o telefone - "Vou ficar atento!".

 

Mais alguns minutos e um novo toque no controle remoto! Desta vez, o Diretor imediatamente largou a caneta e foi direto aos papéis da mesa, remexendo-os para ver se encontrava algo, mas nada!

 

"- Tem alguma coisa aí!" - pensou, já um pouco preocupado.

 

Mas ele voltou ao trabalho e pegando o telefone fez uma nova chamada, sem tirar os olhos da mesa. Dona Neide, na outra sala via pela divisória de vidro que o aparelho "estava fazendo efeito". Pelo interfone ela avisou o Professor Ventura que passou a notícia a Beto e Cleto. Os dois rapazes riram e agitados comentaram:

- Está funcionando! Sucesso! Ele está preocupado!

 

No toque seguinte, a reação foi mais forte. Num salto, o Diretor deu um tapa nos papéis que julgou mexer e chamou alto a secretária:

 

- Dona Neide! Venha cá!

 

A secretária atendeu, e logo que entrou na sala o professor Salgado falou agitado:

 

- Tem alguma coisa na minha mesa! Eu vi, mexeu!

 

Dona Neide, afastada da mesa, procurando não despertar suspeitas ainda perguntou de modo inocente:

 

- Mas, o que pode haver na mesa? Não estou vendo nada!

 

- Fique olhando! Preste atenção!

 

O Diretor esperou ainda um pouco, e como nada aconteceu, dispensou a secretária, não sem pedir desculpas. Ele ainda pensou alto:

 

- Acho que o café da manhã estava forte demais ou realmente tem coisa! Pode ser um rato! Sim, um rato!

 

Preocupado, o Professor Salgado sentou vagarosamente sem tirar os olhos da mesa e se muniu de um canudo de papelão bem grosso, que usava para guardar "plantas" com quase dois metros de comprimento e cheio!

 

- Se mexer de novo eu pego!

 

E mexeu!

 

O "estouro" que o impacto do canudo de papelão produziu foi ouvido na outra sala e assustou as secretárias e os outros funcionários! Quando meia dúzia de pessoas entrou na sala do Diretor, pedindo permissão antes, é claro, ainda puderam ver uma boa quantidade de papéis "voando" e o professor Salgado em pé com o "canudo de papelão" na mão! Sem saber o que dizer, os funcionários receberam uma explicação meio "esfarrapada" do Diretor:

 

- Caiu o peso de papéis! Está tudo bem! Não é nada, não!

 

Os funcionários voltaram para seus locais de trabalho e o Diretor, depois de recolher os papéis do chão, sentou-se na sua cadeira muito preocupado! Esperou alguns minutos e como nada aconteceu, voltou ao trabalho, mas não tirou os olhos da mesa!

 

Dona Neide deu mais um toque no controle remoto, e até tampou os ouvidos esperando um novo "estouro", mas não foi isso que ocorreu! Abrindo a porta de sua sala, o professor Salgado atravessou a sala maior da secretaria e outros funcionários saindo apressado por algum tempo. Ainda puderam ouvi-lo comentar baixinho, com raiva:

 

- Preciso de ajuda! Vou buscar a "Marieta"!

 

" - Vai procurar ajuda! Mas, estranho! Não conheço nenhuma funcionária chamada Marieta! Será nova?" - pensou a secretária, meio preocupada.

 

Alguns minutos depois o Professor Salgado voltou com uma enorme caixa comprida debaixo dos braços, trancando-se novamente na sua sala! Se Dona Neide tivesse visto o conteúdo da caixa, certamente não apertaria novamente o botão do controle remoto, mas como não viu, ela apertou!

 

O que foi ouvido agora não foi um pequeno estouro, mas uma verdadeira "explosão"! Na verdade foi um tiro, pois o que o professor Salgado trazia na caixa comprida e, que depois de tirar, deixou no chão preparada, era "Marieta", uma enorme espingarda de tiro único, ou melhor um velho "bacamarte" de carregar com pólvora pela boca! Pertencia ao tataravô do professor Salgado, que foi um dos exploradores que, com Brederodes Rancatoco, fundou a cidade! O "estampido" da "Marieta" podia facilmente ser ouvido a quilômetros de distância e o "coice" da "coisa" então, derrubava facilmente qualquer soldado de menos de dois metros de altura e cem quilos de peso! Mantida como relíquia de família, o Professor Salgado se gabava de que ela ainda funcionava perfeitamente! E como funcionava!...

 

Dona Neide caiu da cadeira e Dona Rosa jogou para cima o vidro de tinta para carimbos borrando tudo! Duas das outras funcionárias deram um grito e o "boy" que entrava na sala naquele momento "mergulhou" debaixo de uma mesa para se proteger! A servente, que vinha com o "cafezinho", jogou tudo para cima e correu!

 

O Professor Ventura, Beto e Cleto que estavam na sala ao lado também se assustaram e, percebendo o barulho vinha da sala do Diretor, vieram correndo! Preocupados, ainda viram a fumaça que saia da janela do lado de fora!

 

Na verdade, o "estouro" tinha feito um bocado de estragos em toda escola, como alguns pratos que, com o susto, foram soltos pela cozinheira; alguns frascos de vidro que foram quebrados no laboratório de química; os traços tremidos de meia dúzia de projetos que estavam sendo feitos pelos alunos de placas de circuito impresso, etc. Muitos copos de água com açúcar, um ótimo calmante, foram necessários para trazer a escola de volta à normalidade!

 

Uma pequena multidão entrou na sala do diretor, e desta vez sem pedir licença, pois pela fumaça que saia debaixo da porta, percebia-se que algo grave tinha ocorrido!

 

- Vai precisar de socorro! - dizia o professor Sales.

 

- Chame os bombeiros! - gritou outro funcionário correndo para o telefone.

 

- Um Médico! Um Médico também! Ele pode estar ferido!

 

Como pelo vidro da divisória, embaçado pela fumaça, não era possível ver nada, a porta foi imediatamente aberta!

 

Quando todos entraram, incluindo o Professor Ventura, Beto e Cleto, e a janela foi aberta para sair a fumaça, as "coisas" se desanuviaram e a cena que se descortinou foi muito interessante:

 

Na divisória, atrás da cadeira do diretor, havia um rombo com o formato da silhueta de uma pessoa. Do outro lado, ainda sentado na cadeira tombada, com as pernas para cima, estava o meio atordoado Professor Salgado com a espingarda, ainda fumegante na mão! Na mesa não haviam mais papéis, mas sim uma enorme mancha preta de queimado com um furo no meio! Os papéis todos, alguns ainda soltando fumaça e caindo, estavam espalhados por toda a sala! O único comentário que o professor Salgado fez, ainda meio tonto, vendo pelas lentes trincadas dos óculos as pessoas preocupadas, foi:

 

- Acho que peguei o "bicho"!

 

Ajudado por todos, ele foi levado para fora, para tomar um pouco de "ar fresco". O professor Ventura aproveitou a confusão para expulsar as pessoas da sala e ficou com Beto e Cleto, para dar uma olhada. Na verdade, preocupado, ele retirou a bobina e o controle remoto rapidamente do local!

 

Não é preciso dizer que ele foi seriamente censurado por Dona Neide pelas consequências da "brincadeira", mas conseguiu fazer com que ela e Dona Rosa prometessem não contar nada a ninguém:

 

- Se vocês prometerem não contar nada eu não faço mais isso!

 

Dona Neide estava ainda irredutível, mas ele tinha um meio de convencê-la:

 

- Lembre-se de que foi você que apertou o botão!

 

A sala foi "reformada" e uma nova mesa colocada. Nenhum "bicho" estranho foi encontrado nos restos removidos pelos serventes, o que deixou o Diretor meio desconfiado. Mesmo assim ele voltou logo ao trabalho! Desta vez, entretanto, Dona Neide se surpreendeu logo no primeiro dia da volta: o Diretor tinha apenas três pequenas pilhas de papel muito bem organizados sobre a mesa e ainda prometeu:

 

- De agora em diante vai ser assim! Organização acima de tudo!

 

Dona Neide podia então. de sua mesa ver o Diretor trabalhando satisfeito. Apenas de quando em quando ele dava uma olhadinha, meio desconfiado para as pilhas de papel esperando algum tipo de movimento, e lembrando o ocorrido, pensava em voz alta:

 

- Mas, que mexeu, mexeu!

 

 

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