As linhas de transmissão são amplamente utilizadas nos diversos sistemas de comunicações atuais. Quer sejam eles sistemas que operam com dados, voz ou vídeo, são utilizados condutores elétricos que apresentam características especiais. Linhas de transmissão não são simples conjuntos de fios condutores, mas sim fios que têm disposição e características elétricas específicas, conforme veremos neste artigo em que abordamos o aspecto histórico da adoção do valor 600 ? para aplicações telefônicas.

 

 

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Uma forma simples de definir uma linha de transmissão e que encontramos nos dicionários técnicos é "o sistema condutor entre os elementos de um sistemas que transportam sinais" (Dicionário de Termos Elétricos e Eletrônicos ANSI/IEEE Std 100-1977).

No entanto, se levarmos em conta as aplicações finais das linhas de transmissão, com as características que elas devem possuir, vemos que essa definição, muito ampla no significado, pode ser consideravelmente estreitada.

Assim, uma definição muito melhor é a que define uma linha de transmissão como "um arranjo de condutores elétricos através dos quais a energia eletromagnética pode ser transportada a distâncias relacionadas com os comprimentos das ondas eletromagnéticas".

Veja que uma linha de transmissão difere de um simples conjunto de fios já que sua indutância, capacitância e resistências não dependem da distância.

Uma linha de transmissão tem o que se denomina "impedância característica", ou seja, uma impedância que pode ser medida numa extremidade de uma linha de comprimento infinito, conforme mostra a figura 1.

 

Figura 1 - Uma linha de comprimento infinito
Figura 1 - Uma linha de comprimento infinito

 

A importância dessa impedância está no fato de que, para qualquer comprimento da linha temos sempre uma impedância com esse valor e com isso a energia fluindo ao longo dela é sempre absorvida pelo elemento terminal e nenhuma energia é refletida. Essa é a definição do Radiotron Desginer's Handbook - que o autor do artigo possui em sua edição original de 1953! (veja nota do autor).

 

O Radiotron Designer's Handbook é um manual completo de eletrônica que em 1953 se encontrava já na sua quarta edição. Esse manual com 1 500 páginas reunia todos os conceitos básicos, principalmente de circuitos com válvulas, vigentes na ocasião. Os princípios básicos de funcionamento de muitos circuitos abordados naquela época são analisados de forma que até hoje se mantém atual. Disponível para download no site.

 

Para os sinais de baixas freqüências. foram as empresas de telefonia que primeiramente fizeram o uso das linhas de transmissão balanceadas, segundo os conceitos que demos. Os sistemas antigos não tinham nenhum sistema de amplificação e mesmo assim podiam trabalhar com sinais de áudio, em distâncias limitadas a uns 32 km (20 milhas).

Sabemos que, para uma fonte de sinal de determinada impedância, a maior quantidade de energia será transferida para uma carga quando ela tiver a mesma impedância. Deve haver um "casamento de impedâncias" entre a fonte de sinal e a carga, conforme mostra a figura 2.

 

Figura 2 - Máxima transferência de energia
Figura 2 - Máxima transferência de energia

 

Se os dois extremos de uma linha de transmissão não tiverem cargas com a mesma impedância, ocorrem reflexões com o aparecimento de ondas estacionárias, conforme mostra a figura 3.

 

Figura 3 - Reflexões criando ondas estacionárias
Figura 3 - Reflexões criando ondas estacionárias

 

Essas reflexões fazem com que parte da energia que deva ser transmitida à carga retorne ao transmissor (fonte).

Veja que, como observamos na definição que as distâncias devem ser comparáveis aos comprimentos de onda, os efeitos dados ocorrem somente onde o tempo que o sinal demorar para propagar entre os extremos da linha é significativo em relação ao seu comprimento de onda.

Para uma linha de 20 km de comprimento, por exemplo, como a usada em telefonia, o tempo de propagação é significante para as freqüências dos sinais de voz.

Se as impedâncias não estiverem casadas nas duas extremidades as reflexões e as ondas estacionárias podem causar sérios problemas de resposta de freqüência.

Os primeiros engenheiros de telefonia da Bell sabiam disso, mas a impedância dos sistemas telefônicos antigos era determinada muito mais pelo comprimento dos fios usados e sua disposição física, que já existiam na ocasião para uso em telegrafia, do que resultado de algum tipo de padrão ou planejamento.

 

Figura 4 - Linha telefônica típica
Figura 4 - Linha telefônica típica

 

Lembramos que, para calcular a impedância de linha de transmissão formada por um par de fios separados por uma certa distância, usamos a fórmula:

 

Z = 276 log (2D/d)

 

Onde:

Z é a impedância da linha de transmissão em ?

D é o espaçamento dos condutores em mm (*)

d é o diâmetro dos condutores em mm (*)

 

(*) "D" e "d" podem ser expressos em cm ou polegadas desde que na fórmula sejam usados na mesma unidade.

 

Por esse motivo, para as linhas telefônicas o valor de 600 ? se tornou um padrão para a impedância.

Um problema que ocorre com as linhas telefônicas desse tipo é que elas correm paralelamente às linhas de transmissão de energia por muitos quilômetros, sendo por isso passíveis de uma forte indução de ruídos e interferências, conforme mostra a figura 5.

 

Figura 5 - Captação de ruídos por uma linha telefônica
Figura 5 - Captação de ruídos por uma linha telefônica

 

Essa interferência, entretanto é eliminada na maior parte devido à sua operação balanceada. O sinal induzido num condutor é cancelado pelo sinal induzido no outro condutor.

Assim, para os sistemas antigos que não tinham nenhum dispositivo amplificador para os sinais, a utilização de linhas balanceadas e com a impedância casada era fundamental para se obter um desempenho razoável.

Mais tarde, com o crescimento das redes, novos dispositivos foram agregados ao sistema como amplificadores, filtros e também os transformadores híbridos, conforme mostra a figura 6.

 

Figura 6 - Usando um transformador
Figura 6 - Usando um transformador

 

Para todos esses novos dispositivos a operação correta dependia do casamento de impedâncias. Todos deveriam ter características que se casassem com a impedância de 600 ? da linha.

Posteriormente, o mesmo valor de impedância passou também a ser adotado por outros equipamentos como, por exemplo, os equipamentos de áudio, nas estações de rádio, estúdios de gravação e outros locais que na época eram os que trabalhavam com a transmissão de sinais de áudio.

A utilização da impedância de 600 ? era importante para as rádios e seus equipamentos, pois muitas transmissões de locais distantes (reportagens, acompanhamento de jogos) eram feitas utilizando-se o link da linha telefônica.

Amplificadores, filtro passivos, e muitos outros equipamentos passaram a ter então a impedância de 600 ? padronizada para suas entradas e saídas. Esses equipamentos, muito comuns na década de 1960, são ainda usados hoje em algumas aplicações.

Para os equipamentos profissionais de áudio modernos entretanto, o que se visa não é a máxima transferência de potência, mas sim o máximo fornecimento de tensão.

Assim, os dispositivos devem ter baixas impedâncias de saída e altas impedâncias de entrada. Existe um padrão do IEC de 1978 que exige impedâncias de saída de 50 ? ou menores, e impedâncias de entrada de 10 k? ou maiores.

Esses procedimentos de interligação são denominados "casamento de tensão" tendo por principal finalidade minimizar os efeitos da capacitância dos cabos e ao mesmo tempo permitir que uma única saída possa excitar diversas entradas com um mínimo de perdas de nível de sinal, conforme mostra a figura 7.

 

Figura 7 - Casamento de tensão
Figura 7 - Casamento de tensão

 

Os cabos de áudio atualmente usados não precisam de terminações de impedância fixa. Para um sinal de 20 kHz, por exemplo, num cabo comum, o comprimento de onda é de aproximadamente 12 200 metros.

Conforme vimos, somente no caso do comprimento de onda se tornar significativo quando comparado com o comprimento do cabo é que os efeitos podem se tornar problemáticos.

Na prática isso ocorre com 10% do comprimento de onda, o que para sinais de áudio das freqüências mais altas (20 kHz) corresponderia a 1 200 metros, aproximadamente.

Dessa forma, com raras exceções, tais como no caso de equipamentos telefônicos, o uso de fontes casadas de 600 ? em equipamentos de áudio não é algo absolutamente necessário e além disso pode até degradar a performance.

Por exemplo, para excitar uma linha que tenha uma carga de 600 ?, em lugar de 20 k?. com um nível de +22 dBu, é preciso um adicional de 23 mA de corrente do driver.

Como o amplificador usado para isso pode sofrer as conseqüências da capacitância do cabo, uma limitação nas altas freqüências pode comprometer seu funcionamento.

Em outras palavras, para equipamentos de áudio, a idéia de se usar linhas de 600 ? é algo ultrapassado, que não se aplica mais nos equipamentos modernos.