Em artigo anterior mostramos aos leitores o que são as fibras ópticas, analisando o modo como os raios de luz podem ser mantidos em seu interior por meio de reflexões totais sucessivas. Neste artigo teremos praticamente uma continuidade do anterior (TEL014), analisando algumas propriedades importantes das fibras ópticas comuns a o modo como são fabricadas para que possam ser usadas mais eficientemente nas comunicações. Uma estrutura de material tão frágil como o vidro e com espessuras que não ultrapassam frações de milímetros exige uma tecnologia muito avançada para o processo de fabricação e isso é o principal motivo pelo qual somente agora tenhamos uma disponibilidade maior para as aplicações práticas.

 

 

No artigo anterior, em que analisamos a estrutura de uma fibra óptica comum, vimos que a utilização de uma capa de material de índice de refração menor, envolvendo um cerne que é a parte condutora propriamente dita, além de eliminar os problemas causados por arranhões e deformações pelo processo de fabricação nos levava à possibilidade de fabricar fibras ópticas de maior confiabilidade com muito maior rendimento.

Esta técnica, entretanto, serviu de ponto de partida para se obter outras estruturas capazes de levar a produção de fibras ópticas com muito melhor rendimento na transmissão dos sinais e até mesmo maior resistência mecânica.

Um tipo importante de fibra óptica é a obtida com materiais de índices de refração escalonados que são depositados em torno de um cerne conforme mostra a figura 1.

 

A partir do cerne de material de maior índice de refração são formadas capas  sucessivas de materiais de índice de refração cada vez menores. Conforme mostra a figura, temos uma diminuição em "degraus" do índice até obter o menor valor na capa mais externa que ainda assim tem índice maior que o do meio exterior.

Desta forma, um raio de luz que tenha de se propagar por esta fibra é curvado segundo uma trajetória mostrada na mesma figura 1, ficando totalmente "preso" no seu interior. A trajetória será formada por pequenos segmentos de reta que têm seus extremos nos pontos em que ocorre a transição de índice de refração de uma capa para outra.

Um outro tipo de fibra óptica, que apresenta um comportamento semelhante à anterior, é a que tem a estrutura mostrada na figura 2.

 

Nesta fibra temos um material em que o índice de refração diminui continuamente do centro para as bordas, de modo a se comportar com uma fibra "escalonada"  mas com degraus infinitamente pequenos. Desta forma, um raio de luz que deva ser transmitido por esta fibra curva-se de uma forma suave numa trajetória espiral, se entrar nesta mesma fibra segundo um ângulo oblíquo, conforme mostrado na figura 3.

 

Um ponto importante da transmissão de luz através de uma fibra que tenha esta estrutura é a baixa dispersão. Isso não ocorre com as fibras de capa única de material, onde a dispersão é maior, pois ela ocorre justamente nas transições entre os dois materiais.

Outro fator que deve ser levado em conta é o seguinte: enquanto na fibra que tem o cerne de material de densidade única, onde a luz se propaga, a velocidade é constante (a mesma em qualquer ponto), na fibra de densidade que decresce nas bordas, os raios de luz viajam com velocidade maior nesta região e com velocidade menor no centro.

O resultado final disso é que, velocidades diferentes de propagação podem causar problemas de interferências que afetam o desempenho da fibra e são muito importantes na qualidade da transmissão de dados.

 

INTERFERÊNCIAS

Para facilitar o entendimento dos princípios básicos de funcionamento de uma fibra óptica é comum considerar a luz como uma forma de radiação que se propaga em linha reta como um raio infinitamente fino. No entanto, este modelo de descrição da luz não corresponde ao que ocorre na prática e dependendo do fenômeno que se analisa pode até ser interessante não tê-lo em mente.

O caráter ondulatório das emissões de luz é algo que deve ser muito lembrado quando se trata da análise de alguns fenômenos que podem ocorrer e que são importantes no caso das fibras ópticas.

Vamos supor inicialmente a existência de duas fontes pontuais de sinais eletromagnéticos (que podem ser de luz comum) de frequências únicas, conforme mostra a figura 4.

 

A combinação dos dois sinais em determinados pontos pode resultar em uma soma de suas amplitudes ou no seu cancelamento, conforme mostra a mesma figura: temos então pontos de máxima intensidade e pontos de nulo em que não é notada a presença da radiação.

Este fenômeno pode ser observado quando usamos duas fontes pontuais de luz (simuladas por dois furos muito pequenos num obstáculo opaco por trás do qual exista uma fonte monocromática de luz) e se formam anéis claros (nos pontos de máximo) e anéis escuros (nos pontos de mínimo), conforme mostra a figura 5.

 

 

Numa fibra óptica a interferência pode ocorrer com a radiação que se propaga em diversas trajetórias, dado que a fonte de emissão normalmente não consiste num ponto único, mas tenha certa extensão. Pode ocorrer então que, justamente no ponto de "captação" (um sensor) da radiação tenhamos uma franja de interferência destrutiva ou um ponto "escuro" com menor intensidade de sinal. É o que ocorre no exemplo da figura 6 em que temos duas trajetórias diferentes para a luz de uma mesma fonte, através de uma fibra óptica, chegando ao final justamente em oposição de fase e com isso causando um fenômeno de interferência destrutiva.

 

O diâmetro de uma fibra óptica é muito importante na ocorrência deste fenômeno, pois pode permitir que tenhamos maior ou menor quantidade de trajetórias possíveis para a luz que se propaga através dela. Isso leva a uma classificação das fibras segundo os "modos" como a luz se propaga.

Evidentemente, o modo de ordem mais baixa é aquele que corresponde à propagação direta, enquanto que o modo de ordem mais alta é aquele em que temos o maior número de reflexões.

Na figura 7 mostramos três ordens de modos de propagação da luz numa fibra óptica.

 

É importante observar que uma quantidade maior de modos possíveis de propagação de um sinal numa fibra óptica reduz a faixa passante, já que as possíveis interferências causam uma deformação dos pulsos de informação conforme mostra a figura 8. Isso é de extrema importância na transmissão de dados em que maior faixa passante significa maior quantidade de dados que podem ser transmitidos.

 

O que ocorre neste caso é que, para uma fonte de certa extensão, na produção do pulso, luz de diferentes regiões da fonte entra ao mesmo tempo na fibra óptica, mas como os pulsos fazem trajetórias diferentes, chegam ao final em instantes diferentes.

Se a trajetória a ser percorrida for muito longa, e os pulsos que devem ser transmitidos estiverem muito próximos uns dos outros (alta velocidade de transmissão de dados), a diferença de tempos de chegada pode tornar-se suficientemente grande para que tenhamos uma perda da identidade do sinal, como já visto na figura 8.

Para uma frequência de 200 MHz, por exemplo, a uma distância de 100 metros os pulsos já começam a chegar suficientemente juntos, numa fibra comum, para que tenhamos uma considerável deformação do sinal, mas a informação ainda pode ser recuperada. No entanto, com 200 metros, nesta mesma frequência, os pulsos já se "embaralham" o suficiente para que a informação não mais possa ser recuperada.

É por isso que uma especificação muito importante para uma fibra óptica é a sua faixa de utilização em Megahertz x quilometro (MHz x km). Assim, uma fibra óptica de 200 MHz x km pode transmitir uma informação na frequência de 200 MHz até uma distância de 1 km sem que ocorra o "embaralhamento" total da informação, ou ainda uma informação na frequência de 100 MHz a 2 km, sem problemas.

As fibras com diversas capas ou com índice de refração que muda gradualmente apresentam um comportamento que torna a faixa de utilização muito maior que as fibras comuns.

Numa fibra deste tipo, a propagação para as trajetórias de baixa ordem se faz segundo um material de densidade constante e maior do que o da periferia, já que eles se propagam mais pelo centro da fibra. O resultado disso é uma velocidade menor.

Já os sinais de ordem mais alta se propagam mais pelo material de índice menor da periferia onde a velocidade é maior. Desta forma, a  velocidade maior compensa a trajetória mais longa e com isso os sinais tendem a percorrer a fibra no mesmo intervalo de tempo, independentemente de seu comprimento.

 

TIPOS DE FIBRAS

Além do vidro comum, o plástico também pode ser usado na fabricação de fibras ópticas. Temos então três tipos principais de fibras ópticas:

a) fibras com cerne de plástico e capa plástica

b) fibras com cerne de vidro e capa plástica - também chamadas PCS

c) fibras com cerne de vidro e capa de vidro - sílica - clad silica.

 

Os vidros empregados na fabricação das fibras podem ainda conter materiais como o chumbo, sódio ou ainda o boro, com finalidade a dotar-lhes de propriedades apropriadas a aplicações específicas.

Vejamos a seguir como são fabricadas as fibras mais comuns:

 

Fibras Ópticas Plásticas

As fibras ópticas de plástico são construídas com material transparente apresentando com principal característica o diâmetro elevado (da ordem de até 1 mm), flexibilidade boa e fácil preparação dos acoplamentos.

As extremidades podem ser preparadas para as conexões ópticas simplesmente pelo corte com uma lâmina afiada (uma lâmina de barbear, por exemplo).

Entretanto, estas fibras apresentam perdas elevadas o que limita suas aplicações à transmissão de sinais a curtas distâncias, que não ultrapassam a alguns metros.

Também deve ser levado em conta que o plástico não suporta temperaturas elevadas e por isso deve ser prevista uma proteção especial.

 

Fibras Ópticas de Vidro

Pelas suas propriedades ópticas, este é o material preferido para a fabricação das fibras ópticas, se bem que, pelas demais propriedades (principalmente mecânicas), exija técnicas bem mais elaboradas para isso.

Na figura 9 temos o processo primitivo de fabricação em que se parte de um tubo cilíndrico de vidro de maior densidade que é envolvido por uma capa de menor densidade.

 

Submetido a uma temperatura elevada na extremidade na extremidade, o conjunto se funde e "escorre" dando origem a um fio fino que é a própria fibra óptica.

Esse processo resulta em fibras ópticas com perdas algo elevadas, da ordem de 500 dB/km, mas a utilização de materiais especiais têm levado à produção de fibras que podem ser utilizadas com sucesso em sistemas de comunicação a curta distância. Um processo alternativo é mostrado na figura 10.

 

Tanto o vidro fundido de maior densidade como o de menor densidade, mantidos em cadinhos de platina, são extrudados por uma saída única de modo a formar a fibra óptica.

Este processo permite a produção de fibras ópticas com baixas perdas e além disso, num processo contínuo, o que significa que não há limitação para o comprimento da fibra a ser fabricada.

 

Fibras de Sílica

A sílica (SiO2) é uma substância que existe na forma natural como quartzo. Esse material também pode ser produzido sinteticamente e apresenta perdas ópticas internas muito baixas, o que torna-o ideal para a fabricação de fibras ópticas de boa qualidade.

No entanto, este material apresenta um índice de refração muito baixo em relação ao vidro comum e mesmo outros materiais, como o próprio ar, o que dificulta sua utilização na prática pois, a capa externa, como vimos, deve ter um índice de refração ainda menor. Para a utilização deste material, técnicas especiais tiveram de ser desenvolvidas.

Uma das técnicas é a denominada VDS (vapour deposited silica) e consiste na deposição de camadas radiais de germânio dopado com sílica num tubo central (cerne) que passará a ter um índice de refração maior.

O tubo é posteriormente contraído de modo a formar a fibra óptica, conforme mostra a figura 11.

 

Estas camadas são produzidas passando gases pelo tubo, ao mesmo tempo em que ocorre o aquecimento. Pela variação dos constituintes destes gases, tanto a região interna de maior índice de refração como as capas externas podem ser formadas.

Como a composição dos gases em função dos dopantes pode ser facilmente modificada e de maneira praticamente contínua, é fácil graduar-se a produção de modo a resultar numa estrutura com índice de refração que se modifica continuamente, quando a percorremos do cerne para as camadas periféricas.

Com esta técnica é possível produzir fibras ópticas com perdas muito baixas, que chegam a apenas 1 dB por quilometro, mas os tipos comerciais, em geral tem valores de perdas um pouco mais elevados.

 

Fibras PCS

Estas fibras são formadas por um núcleo de sílica pura sobre o qual aplica-se uma camada de resina de silicone de menor índice de refração, conforme mostra a figura 12.

 

Esta técnica possibilita a fabricação de fibras ópticas de grandes diâmetros. As perdas conseguidas para estas fibras não são das menores, ocorrendo uma certa penetração de luz no material da capa externa, mas os valores constatados são aceitáveis para muitas aplicações práticas.

Esta passagem da luz do cerne para o material exterior ocorre principalmente nos modos de propagação de maior ordem, quando o ângulo de incidência nas paredes (pontos de reflexão) é maior.

Isso significa que a fibra deve ser usada com ângulos de abertura menores, de modo a se evitar justamente a incidência de radiação em ângulos em que as perdas sejam maiores.

Fibras deste tipo possuem então especificações de perdas que dependem do ângulo segundo o qual a luz incide, segundo uma características não linear.

 

 

Fios e Cabos

Se bem que muitas fibras ópticas apresentem uma resistência mecânica considerável, a sua utilização sem qualquer proteção externa não é desejável. A própria ação do meio ambiente, contatos e choques mecânicos com outros objetos podem levar a fibra óptica a sofrer danos ou deterioração, além de alterações de suas principais características.

Por isso, existem proteções externas semelhantes às usadas nos fios condutores metálicos de sinal e energia elétrica comuns.

Nas fibras do tipo PCS a proteção pode ser a própria resina de silicone. Esta mesma resina também pode ser usada para servir de proteção externa para outros tipos de fibras ópticas. A capa externa de uma fibra que mantém contato direto com a mesma para sua proteção é denominada "capa primária".

É importante observar que a proteção externa de uma fibra óptica deve ser cuidadosamente projetada de modo a não alterar as características ópticas apresentadas. Pequenas imperfeições da capa que forcem uma fibra a pequenas curvas (micro-curvas) em determinados pontos pode afetar suas características e com isso causar perdas. Estas micro-curvas, por exemplo, podem ser provocadas por uma pressão maior da capa sobre a fibra no momento da fabricação, deformando o seu material, conforme sugere a figura 13.

 

A contração do material da capa, principalmente no caso do plástico pode também fazer com que a fibra se dobre formando uma trajetória em hélice que é responsável por perdas indesejáveis.

A adoção de um severo controle de qualidade do material emprego na elaboração das capas dos fios é a melhor solução para se obter fibras ópticas com perdas muito pequenas.

Um problema importante que deve ser ainda previsto com a utilização de uma capa que, por deformação, aperta a fibra e que dificulta seu acoplamento a dispositivos externos como receptores e transmissores é mostrada na figura 14.

 

Técnicas especiais prevêem esta deformação para a utilização de conectores e acopladores especiais.

Do mesmo modo que no caso dos fios comuns, as fibras ópticas podem ser agrupadas em cabos conforme mostra a figura 15.

 

Os mesmos cuidados em relação ao material, esforços mecânicos e deformações devem ser observados de modo a se evitar problemas que afetem as características ópticas das fibras.

Observe a existência de um material sólido de alta resistência mecânica como suporte central para o cabo, e que tem por finalidade aumentar sua resistência à tensão mecânica.