Existem circuitos elétricos nos quais, no instante em que são ligados circulam correntes muito mais altas que a corrente em regime estacionário. Pode se minimizar essa situação utilizando componentes cuja resistência é termicamente variável conectados de modo a reduzir essa corrente excessiva, a Philips Components (*) apresenta uma série de famílias desses componentes, chamados NTC, cuja utilização será abordada neste artigo.

O artigo é de 1991. Agora a Philips Componentes é a NXP

 

Corrente de Partida

Corrente de partida (ou corrente de surto) é uma corrente muito elevada que percorre um circuito elétrico, fluindo através da carga, no momento em que o circuito é fechado.

Isto ocorre com cargas que apresentam impedância muito baixa no momento do fechamento do circuito. Como exemplo disso podemos citar:

- Um capacitor não carregado;

- Um motor ainda não em movimento;

- Uma lâmpada incandescente ainda não quente.

Na figura 1, podemos ver a representação de um circuito elétrico básico e a curva característica da corrente de surto, para uma carga qualquer.

 

Figura 1 – Característica de surto de ligação
Figura 1 – Característica de surto de ligação

 

 

Limitação da Corrente de Surto

Na prática, é desejável eliminar-se ou reduzir-se essa corrente excessiva no instante do fechamento do circuito pois a existência dela reduz o tempo de vida das chaves interruptoras, provoca queima de fusíveis e prejudica a vida útil dos motores e similares.

 

Utilização do NTC

Uma forma encontrada para a limitação da corrente de surto consiste na utilização, em série com o circuito elétrico, de dispositivos cuja resistência ôhmica, de alguma forma possa variar.

A utilização de resistores variáveis com a temperatura,foi uma forma encontrada e os componentes do tipo NTC (do inglês coeficiente negativo de temperatura) mostraram-se adequados.

Neles o valor da resistência ohmica diminui à medida que a sua temperatura se eleva, quer por seu aquecimento próprio ou por agentes externos.

Na figura 2 vemos um exemplo de um circuito constituído por um NTC em série e a curva característica mostrando as duas situações.

 

Figura 2 – Circuito com NTC
Figura 2 – Circuito com NTC

 

Cargas diferentes poderão constituir o tipo utilizado no circuito elétrico, tais como: cargas H, L, C.

Vejamos um exemplo típico onde a carga apresenta característica resistiva.

É o caso de uma Lâmpada incandescente.

Ela se constitui de um fio resistivo do tipo “Wolfran". Sua resistência quando frio é de apenas 4 Ω e quando aquecido é de 40 Ω, quando sua potência é de 300 W, em 110 V.

Neste caso, suas condições de trabalho serão:

a) Condição de trabalho normal (estacionário):

 


 

 

b) No instante do acendimento:

 


 

 

Corrente esta que é elevada e prejudicial à vida útil da lâmpada e mesmo dos componentes do circuito, como chaves, fusíveis, etc.

Uma forma de minimizar o problema consiste em se colocar um dispositivo NTC em série com o circuito da lâmpada.

Nestas condições teremos:

- Resistência de fio:"Wolfram" frio: 4 Ω a

- Aquecido: 40 Ω

- Resistência do NTC à temperatura ambiente: Rzs = 20 Ω

- Aquecido: RNTC = 0,4 Ω (por efeito Joule)

Logo teremos:

1 - Chave fechada (instante inicial) Corrente de partida limitada a:

 


 

 

Potência dissipada no NTC

 


 

 

 

2 - Após alguns milissegundos teremos:

Corrente estacionária:

 


 

 

Na figura 3 pode ser visto o diagrama esquemático desse circuito, com a indicação das tensões respectivas.

 

Figura 3 – Circuito com tensões
Figura 3 – Circuito com tensões

 

Observe que em regime estacionário quase não existe perda de energia na carga, uma vez que a tensão a ela é aplicada é praticamente a tensão de alimentação.

Caso, no mesmo circuito da figura 3 fosse utilizado um NTC de valor resistivo menor à temperatura ambiente, por exemplo:

R25 = 10 Ω e Rquente = 0,3 Ω, teríamos:

NTC = 20 Ω

 

 


 

 

 

Onde se concluir que teríamos:

1 - Maior corrente de partida.

2 - Praticamente a mesma corrente estacionária.

3 - Maior potência de partida no NTC (logo, aquecimento mais rápido).

4 - Menor potência estacionária no NTC (logo,NTC de menor tamanho)

 

TIPOS DE APLICAÇÕES

De um modo geral, os circuitos se dividem conforme os tipos de cargas em:

- Cargas resistivas:

Lâmpada incandescentes

 

- Cargas indutivas:

Motores (aspiradores, Iiquidificadores, etc); Ferramentas elétricas; Transformadores

 

- Cargas- capacitivas:

Capacitores, Fontes de alimentação convencionais ,Fontes chaveadas

 

Um exemplo de aplicação com carga resistiva já foi vista no caso da lâmpada.

Vejamos agora o que acontece quando a carga é indutiva como, por exemplo, um motor elétrico. A situação sem o NTC está representada na figura 4.

 

Figura 4 – Uso com carga indutiva
Figura 4 – Uso com carga indutiva

 

No instante da partida, (fechamento da chave), teremos apenas a resistência do cobre (muito baixa) e como consequência a corrente de partida será alta, ou seja:

 


 

 

Esta elevada corrente de surto (partida) é prejudicial à vida útil da chave, costuma interromper o fusível bem como pode queimar o enrolamento do motor além de danificá-lo por efeitos mecânicos, tais como: a interação de ordem magnética das espiras que constituem o bobinado e que estão percorridos por corrente elevada e por conseguinte criam campos magnéticos bastante fortes ao redor, causando deformações mecânicas, podendo ainda haver deformações do bobinado por rotação elevada (efeito centrifugo).

Adotando-se como elemento de proteção um NTC em que R25 = 50 Ω a nossa corrente de partida será:

 


 

 

A figura 5 nos apresenta o diagrama esquemático da situação.

 

 Figura 5 – Diagrama para a situação
Figura 5 – Diagrama para a situação

 

 

Após alguns poucos segundos, o motor está girando e teremos:

O NTC se aqueceu, logo sua resistência é baixa (fórmula)

A impedância do motor, por razões magnéticas se eleva.

A nova situação é mostrada na figura 6.

 

   Figura 6 – Nova situação
Figura 6 – Nova situação

 

Onde teremos que:

 


 

 

Na figura 7 podemos ver o diagrama da corrente do motor sem NTC e com o NTC.

 

Figura 7 – Corrente com o NTC e sem
Figura 7 – Corrente com o NTC e sem

 

Vejamos agora uma aplicação do NTC como proteção no caso de carga capacitiva.

Na figura 8 vê-se a representação do circuito de uma fonte de alimentação protegida por um NTC em que R25 = 15 Ω

 

Figura 8 – Carga capacitiva
Figura 8 – Carga capacitiva

 

 

No momento em que- a chave é ligada, o capacitor está descarregado, ocasionando um elevado surto de corrente

Sem NTC a corrente será limitada apenas pela resistência série (Rs) (que deve ser de valor baixo para não prejudicar o desempenho do sistema) e pela queda de tensão nos diodos (na ordem de 2 x 1 V).

Logo a corrente de partida (surto) será:

 


 

 

Esse valor de corrente é excessivo para os diodos e para a chave, comprometendo sua duração.

Usando-se um NTC como o citado à corrente de surto fica limitado a:

 


 

 

Já em regime estacionário, o valor de NTC quente é baixo (apenas 0,5 ohm) introduzindo baixa perda de energia.

No caso desta aplicação, é necessário levar-se em conta o valor do capacitor pois dele dependerá o tempo da corrente de partida, e quanto maior for o valor do capacitor maior será o tempo da corrente de carga.

Desse modo, os NTC devem ter seu tamanho adequado (potência) de modo a suportar essa energia durante o tempo de partida.

 

Seleção do NTC

Para escolher o NTC adequado a uma dada aplicação tem-se de levar em conta alguns critérios importantes tais como:

Boa limitação da corrente de surto isto exige do NTC a maior possível.

Perda mínima de potência na carga durante o estado estacionário, onde Rquente do NTC seja a menor possível significando a razão K = Rquente / R25 menor possível.

Corrente estacionária tão alto quanto necessário.

Para podermos combinar estas três condições na escolha do NTC é necessário considerarmos o equilíbrio entre a potência aplicada e a potência dissipada, onde temos:

Energia aplicada = Energia dissipada (extraída) (o que representa a condição de equilíbrio), onde:

 


 

 

E como precisamos alto R25 e elevada corrente estacionária, o desempenho do NTC está determinado por:

- Elevado fator de dissipação "D"

O que exige:

Disco de tamanho grande (o que encarece)

Terminais de 0,8 a 1 mm

Revestimento de cor preta

Elevado TMAXNTC

O que exige:

Material cerâmico de alta qualidade (estável em altas temperaturas)

Solda com alto ponto de fusão

Revestimento que suporta alta temperatura

Baixa razão k

Baixa resistência quando quente

Temperatura elevada

A solução adotada pela Philips Components foi escolher a temperatura de 230°C para o caso de Rquente, (enquanto que outros NTC são especificados para 130°C).

Um detalhe importante é que esta temperatura mais elevada significa uma resistência menor com conseqüente menor dissipação de potência.

Quanto aos procedimentos de montagem, pelo fato de o NTC aquecer-se bastante (cerca de 230°C) os seus terminais não devem ser muito curtos para que se mantenha suficiente distância da placa de circuito impresso.

Estudos feitos constataram que a uma distância de 14 mm do centro do disco do NTC, a temperatura nos terminais pode chegar a 120°C.

Em resumo, os parâmetros importantes ao se selecionar um NTC são:

Tipo de carga: R, L ou C

Em caso de carga capacitiva, o valor de C

A impedância do circuito no momento de ligar

A corrente máxima quando em regime estacionária

A tensão da rede

A máxima corrente de surto, ou R25 do NTC

A título de informações adicionais, o fabricante do componente fornece uma série de curvas para cada família de NTC, curvas essas que auxiliam na escolha do dispositivo adequado e que são relacionados a seguir:

- Curva temperatura x corrente

- Curva resistência x temperatura

- Curva tensão x corrente

Curva resistência x corrente

 

Corrente Máxima de Partida

Após ensaios feitos com diversos tipos de limitadores de corrente de surto, concluiu-se que os dispositivos que fazem partes das famílias abordadas neste artigo conseguem suportar correntes transientes superiores a oito vezes a máxima corrente estacionária do circuito.

 

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