Utilizando potências cada vez menores de modo a poder usar a alimentação de baterias e ser integrada a objetos e pessoas, as soluções wireless surpreendem pelo fato de alcançarem distâncias cada vez maiores. Como pode um transmissor com fração de watt chegar a distâncias de dezenas ou mesmo centenas de quilômetros, sem problemas? As soluções de internet sem fio como a LoRa são exemplos, onde o segredo do alcance está no processo de modulação de que trataremos neste artigo.

Quando Marconi fez seus primeiros experimentos com transmissores de rádio de longo alcance, as potências utilizadas eram gigantescas e as instalações físicas de tais estações ocupavam espaços de muitos campos de futebol.

Para se obter a primeira transmissão através do Atlântico, a potência utilizada por um transmissor típico da época era de 200 kW.

O que ocorria é que o sistema usado de faiscador para produzir as ondas na verdade gerava um sinal que se espalhava pelo espectro, praticamente sem sintonia. Era muito mais um ruído do que realmente um sinal que ocupava uma faixa determinada do espectro.

O resultado é que, além de se necessitar de uma enorme estação receptora para recolher o máximo de sinal possível, ainda havia a dificuldade de se fazer a sintonia.

O rendimento extremamente baixo se devia justamente ao fato de que a potência não estava concentrada numa faixa de frequência estreita que poderia ser sintonizada.

Com a utilização do AM (Modulação em Amplitude), a disponibilidade de dispositivos amplificadores (válvulas) e circuitos capazes de sintonizar uma determinada faixa de frequências as mudanças começaram a ocorrer.

Já era possível concentrar a potência do transmissor numa certa faixa de frequências que então seria emitida. Havia, portanto, uma concentração da energia do transmissor, levando a maior rendimento. Mas, ainda não era o ideal.

Na modulação em amplitude, quando modulamos uma portadora de 1 MHz, por exemplo, com um sinal de 5 kHz, geramos bandas laterais de 1000 – 5 e 1 000 + 5 kHz e se a modulação é variável, como a voz, a transmissão ocupa uma faixa de 10 kHz de largura conforme mostram as figuras abaixo.

 

 Modulação por sinal de frequência fixa
Modulação por sinal de frequência fixa

 

 

Modulação por voz (faixa)
Modulação por voz (faixa)

 

Isso significa que na transmissão, a potência do transmissor é dividida. Se o transmissor é de 20 kW, temos 10 kW para a portadora e 5 kW para cada banda lateral gerada com o sinal modulador.

Essa distribuição de potência por uma faixa do espectro significa uma considerável perda de rendimento na transmissão. É por esse motivo que, com uma transmissão em onda contínua, em que temos apenas uma portadora, o rendimento é muito maior.

Um avanço foi obtido com a técnica de modulação denominada SSB ou Single Side Band que teve o termo em português, Banda Lateral Única Abreviado por BLU.

Esta modalidade de transmissão, muito usada por radioamadores suprime a portadora e uma das faixas laterais obtidas com a modulação, conforme mostra a figura abaixo.

 


 

 

O resultado é que toda a potência do transmissor é agora concentrada numa única faixa que então é transmitida. O resultado é que, para um determinado transmissor, quatro vezes mais potência pode ser utilizada pelo sinal em relação ao mesmo sinal transmitido em AM.

O resultado é claro. Maior rendimento e maior alcance.

Para receber estes sinais, o receptor “gera” um sinal de portadora local através de um oscilador.

Pelo que percebemos, se conseguimos concentrar mais potência numa banda mais estreita, o alcance é maior, mas quanto mais estreita for a faixa, menos informação podemos transmitir.

Na onda contínua (CW), podemos transmitir pontos e traços, daí a transmissão telegráfica ter maior rendimento, no entanto, quando pensamos em passar isso para o digital, novos problemas surgem.

A velocidade de transmissão também está limitada pela largura da faixa, o que quer dizer que quanto mais estreita for a faixa usada e, portanto, maior a concentração de energia que resulta em maior alcance, menor será a velocidade em que dados podem ser transmitidos.

É por esse motivo que as novas tecnologias wireless de longo alcance, como a LoRa só podem trabalhar com poucas centenas de bps (bits por segundo).

A Internet das coisas esbarra, portanto, no difícil problema de conciliar o alcance com a velocidade.

Mas, como podemos obter maior alcance estreitando a faixa de modo a obter maior concentração de energia.

O ideal seria ter uma faixa que fosse tão estreita que a potência tendesse ao infinito, conforme sugere a próxima figura, mas isso é impossível.

 


 

 

As tecnologias das modulações digitais, dos pacotes de radio e do espectro espelhado estão dando a solução para o maior alcance que se pode obter hoje com algumas soluções.

O que se faz é usar o que se chama espectro espalhado e pacotes de rádio nas normas 802.11 que explicamos em nosso artigo TEL073 (Espectro Espalhado e Pacotes de Rádio) e que analisamos agora sob um ângulo um pouco diferente: o da potência.

O que se faz nesta técnica é mudar a frequência do canal que está sendo usado rapidamente e de forma pseudo aleatória dentro de uma faixa determinada de frequências, conforme mostra a figura abaixo.

 

Alterações aleatórias de frequência
Alterações aleatórias de frequência

 

 

A impressão inicial que se tem é que a comunicação está ocupando todo o canal disponível ao longo do tempo.

 

No entanto, com essa técnica temos o espalhamento da energia transmitida de tal forma que a potência média em cada parte estreita da banda é minimizada.

 

Dessa forma, temos um rendimento maior da transmissão, com maior alcance usando menor potência.

 

Está claro que para receber tais sinais, o receptor deve estar absolutamente sincronizado com o transmissor para acompanhar os deslocamentos de frequência do sinal, conforme mostra o diagrama abaixo.

 

Transmissor e receptor devem estar sincronizados
Transmissor e receptor devem estar sincronizados

 

 

A cada salto da frequência do transmissor, o receptor deve procurar a nova frequência em que ele se encontra e sintonizá-lo.

Assim, segundo o padrão 802.11, temos a especificação de deve ser usada a faixa ISM de 2,4 GHz.

A faixa ISM tem uma largura de 83 MHz e foi subdividida em canais de 1 MHz para a especificação FH.

Segundo o FCC, numa transmissão usando esta modalidade de modulação, o sinal que está sendo transmitido deve passar por pelo menos 79 frequências diferentes a cada 30 segundos.

Isso significa 2,5 “hops” ou saltos a cada segundo.

Para que as vantagens desse sistema de transmissão possam ficar claras mais adiante vamos tomar outro exemplo.

Outra forma de espectro espalhado é a denominada DS ou Direct Spread (espalhamento direto, se formos usar a tradução).

Com a técnica DS os dados são misturados (XOR) com uma sequência pseudo-aleatória antes de serem transmitidos modulados em PSK sobre a portadora.

A sequência de dados tem uma velocidade muito alta podendo ser muitas vezes maior do que a velocidade com que os dados são gerados.

Na faixa ISM, o espalhamento está limitado para não ser menor do que a relação 10:1.

Com esta técnica a densidade de energia no espectro cai.

Isso significa que se trata de um sinal que interfere muito menos nos usuários de banda estreita. Existe também uma certa imunidade à interferências.

O receptor que processa os sinais DS começa com a reunião dos sinais.

Isso é feito misturando o sinal com a mesma sequência PN que foi usada para fazer o espalhamento, conforme mostra a próxima figura.

 

Baixa densidade de potência
Baixa densidade de potência

 

 

Isso faz com que o sinal volte a ocupar a faixa original de frequências.

Evidentemente, o receptor também elimina os sinais que correspondem aos espalhamentos dos outros canais que estão operando na mesma faixa.

Podemos dizer que, se houver algum tipo de interferência nessa faixa, ela também ficará espalhada por toda a faixa minimizando os efeitos no canal recuperado, sendo facilmente eliminada pelo filtro de dados, conforme mostra a figura abaixo.

 

Rejeição de interferência
Rejeição de interferência

 

 

Quando a energia do sinal voltou a se concentrar na faixa original, sua energia espectral aumenta de acordo com o ganho do circuito e isso é proporcional a taxa de redução da faixa.

Assim, um sinal que foi recebido com intensidade abaixo do nível de ruído na faixa passa a ter agora um nível acima do ruído e com isso pode ser facilmente demodulado.

Além disso, o sistema DS permite que mais de um usuário ocupe ao mesmo tempo o mesmo canal, proporcionando o que se denomina de acesso múltiplo.

Cada receptor DS reduz somente o sinal desejado para a faixa original, possibilitando assim sua recuperação sem problemas.

Os sinais que não interessam permanecem espalhados, permanecendo assim somente uma pequena dos sinais indesejáveis, conforme mostra a figura abaixo.

 

Acesso múltiplo
Acesso múltiplo

 

 

Em suma, pode-se obter um rendimento maior na transmissão com o aproveitamento maior da energia disponível pela fonte que alimenta o equipamento, o que é de extrema importância numa aplicação IoT.