Como são gravados os sinais de áudio dos aparelhos de videocassete estéreo? Os leitores que trabalham com videocassetes devem conhecer o processo de gravação dos sons em dois canais, para que eventuais problemas de funcionamento possam ser localizados. Neste artigo explicamos como isso é feito, dando algumas informações úteis tanto para localização de falhas quanto para ajustes.
Nota: Artigo publicado na revista Eletrônica Total 114 de 2006
Não seria nada interessante dotar os equipamentos de gravação de sinais de vídeo em fita de todos os recursos que melhorassem a imagem, sem preocupar-se com a qualidade do som.
Na verdade, esse tipo de comportamento por parte dos fabricantes foi observado por muito tempo nos televisores. A imagem foi melhorando durante muitos anos, mas somente há poucos anos a preocupação com o som é que realmente se tornou evidente. O som Estéreo, Surround e Dolby-Estéreo são alguns exemplos disso. No caso dos videocassetes mais antigos, não tínhamos o recurso do som estéreo, mas nos modernos esse recurso é comum, significando que o profissional reparador deve estar apto a trabalhar com eles.
A seguir, analisaremos o modo como os sinais de áudio podem ser gravados em dois canais, aproveitando para recordar um pouco da história dos videocassetes.
O sistema estéreo para videocassetes
O sistema de gravação VHS foi criado em 1979, mas naquela ocasião o sistema original não previa a gravação de sinais de áudio em duas pistas. Havia um único canal de áudio disponível que era gravado num espaço superior da pista, sendo registrado e lido por uma cabeça fixa separada. O sinal de vídeo seria registrado e lido por outra cabeça, do tipo rotativo. O primeiro avanço na qualidade de som ocorreu com a utilização de duas cabeças para leitura e gravação na faixa lateral da fita, mas a qualidade de som obtida era pobre devido à baixa velocidade de avanço, veja a figura 1.
Em 1983 tivemos um segundo avanço que visava corrigir essas deficiências. O sistema foi originalmente desenvolvido para ser usado nos vídeos de 8 mm e teria uma qualidade semelhante a obtida com as gravações em CD.
Aplicado ao sistema VHS ele passou a ser chamado de Hifi VHS, tendo por base a gravação do sinal de áudio, também com duas cabeças rotativas colocadas no mesmo cilindro em que são instaladas as cabeças de vídeo, conforme mostra a figura 2.
Com isso obtém-se uma velocidade relativa muito alta da cabeça em relação à fita, o que aumenta a faixa de frequências que pode ser lida ou registrada. De fato, com o sistema é possível ter a gravação e leitura de sinais na faixa de 20 Hz a 20 kHz, com baixa distorção e grande faixa dinâmica, além de outras vantagens como, por exemplo, a grande estabilidade independentemente da velocidade de gravação (SP, LP ou SLP).
Evidentemente, uma das exigências do mercado, ao passar de um sistema de gravação para outro é a compatibilidade. Assim sendo, o sistema de VHS HiFi deve ser compatível com o VHS comum. Isso significa que as fitas mono ou estéreo devem ser `rodadas" da mesma forma nos dois equipamentos.
Obviamente, uma fita mono não dará uma reprodução estéreo em um VHS HiFi e uma fita estéreo não terá uma reprodução estéreo num aparelho mono.
Entretanto, nos dois casos teremos sons conforme a fita ou o aparelho, observe a figura 3.
Como não existe espaço adicional numa fita para gravar o sinal de áudio nas condições indicadas, pois a fita tem o sinal de vídeo ocupando faixas lado a lado sem intervalo, a solução encontrada foi a criação de um processo de gravação em "multicamadas" ou (no inglês) "multilayer” (Figura 4)
No processo multicamadas, os diversos sinais que fazem parte de uma gravação de vídeo são registrados na fita em profundidades diferentes, conforme ilustra a figura 5.
Dessa forma, partindo dos gráficos da figura 5, vemos que enquanto os sinais de croma e luminância ocupam um espectro que se estende até os 4,4 MHz, os sinais de áudio foram usados para modular duas portadoras, sendo uma de 1,3 MHz para o canal esquerdo e outra de 1,7 MHz para o canal direito.
A modulação das portadoras as desloca 150 kHz para cima e para baixo da frequência central, determinando assim as faixas de áudio que devem ser gravadas na fita.
Então, para que os sinais de áudio e vídeo não sejam misturados, sua gravação ocorre em profundidades diferentes na fita. O sinal de vídeo é gravado primeiro e na parte superficial da fita, enquanto os sinais de áudio são gravados depois e ficam numa profundidade maior da fita.
A passagem da cabeça de áudio antes da cabeça de vídeo tem uma explicação muito simples: quando o sinal de áudio é gravado, ele fica em uma faixa larga da fita, visto que não é possível localizá-lo apenas na profundidade desejada.
Quando a cabeça de vídeo passa, ela apaga a parte superficial do sinal de áudio, gravando assim o sinal de vídeo desejado. Fica então o sinal de vídeo na superfície e o sinal de áudio restante registrado profundamente.
Para obter a separação dos sinais, o azimute das cabeças de áudio e vídeo é de 30 graus, mas existe uma diferença entre seus "gaps" (aberturas) que permite trabalhar com profundidades diferentes de leitura e gravação.
O gap da cabeça de áudio é de 1 µm (grande) para poder trabalhar em profundidades maiores, enquanto o da cabeça de vídeo é menor, 0,3 µm (pequeno) para poder trabalhar com sinais na superfície.
Evidentemente, a presença de sinais diversos, além do chaveamento dos circuitos de vídeo, obrigou que fora dos circuitos de leitura fossem incorporados diversos circuitos de redução de ruído.
Reparação
Conforme os leitores podem perceber, neste sistema não temos cabeças de áudio fixas, mas sim colocadas no próprio cilindro em que estão as cabeças de vídeo.
Como a varredura é transversal, o princípio de leitura e gravação dos sinais de áudio passa a ser semelhante ao dos sinais de vídeo. Isso significa que aqui problemas de ajustes da cabeça que afetem o sinal de vídeo também vão afetar o sinal de áudio, o que não ocorre no sistema convencional.
Da mesma forma, os circuitos de áudio passam a ser muito mais sensíveis aos problemas de leitura e gravação do que no sistema convencional, incluindo o desgaste das cabeças ou ainda a presença de sujeira. A necessidade de fazer uma gravação transversal com chaveamento e modulação em uma frequência muito mais alta leva à exigência de circuitos muito mais complexos.
Na figura 6 temos os diagramas de blocos dos circuitos usados no registro do sinal de áudio de estéreo na fita e dos circuitos de leitura.
É interessante observar que diferentemente dos circuitos de áudio convencionais, temos diversos blocos que operam em frequências elevadas, acima de 1 MHz, o que significa que mesmo sendo um bloco de áudio, o técnico deve estar preparado para encontrar blocos diferentes daqueles comuns aos equipamentos de som.