Os monitores de vídeo e televisores não usam mais os cinescópios de raios catódicos (TRC), pois são do tipo de LEDs, ou outros. No entanto, se o leitor está tentando recuperar um monitor ou televisor antigo deve estar preparado para trabalhar com cinescópios e dois perigos devem ser analisados neste caso:choque e implosão. Neste artigo de 2000 mostramos como levar em conta estes perigos de forma correta.
Ao trabalhar com monitores de vídeo uma das principais preocupações do técnico é com a segurança. De fato, o cinescópio de um monitor de vídeo, assim como o de um televisor, trabalha com forte vácuo o que significa a existência de forças capazes de causar sua implosão e, ao mesmo tempo, com altíssimas tensões que podem ser responsáveis por choques perigosos.
Para a maioria dos técnicos que já trabalham com televisores os procedimentos no trato com um tubo de raios catódicos já é conhecido, mas para os novos e aqueles que vão trabalhar especificamente com estes componentes dos monitores existem alguns pontos importantes que serão discutidos neste artigo.
A atmosfera da Terra exerce uma forte pressão sobre todos os corpos na sua superfície. Nós mesmos estamos sujeitos a uma pressão da ordem de 1 kg por centímetro quadrado da superfície de nosso corpo no nível do mar. Isso significa que uma pessoa está sujeita a uma força total de várias toneladas, se considerarmos a superfície total de seu corpo.
Não morremos esmagados por causa desta forte pressão, porque ela é equilibrada pela pressão que vem de dentro para fora de nosso corpo, conforme mostra a figura 1.
Assim, todos os corpos em nossa volta se mantém inteiros porque a pressão exercida pela atmosfera em todos os sentidos é equilibrada por uma pressão no sentido inverso.
No entanto, quando uma dessas pressões não existir, toda a pressão da atmosfera pode aparecer sobre o corpo sem contraposição, com todos os efeitos destrutivos que isso possa significar.
Esse é o caso de um tubo de raios catódicos.
Um tubo de raios catódicos como o cinescópio de um monitor de vídeo exige a presença do vácuo no seu interior para funcionar, isso significa que em toda a sua superfície externa existe a pressão da atmosfera,mas não existe uma pressão interna para contrabalançar. Isso significa que ele está sujeito a um esforço constante de várias toneladas de fora para dentro, observe a figura 2.
Para que o leitor tenha uma ideia, num cinescópio de grande pressão de fora para dentro devido à presença do vácuo e, portanto, não contrabalançada, é da ordem de 10 toneladas!
Isso exige que os fabricantes não só cuidem para que o material usado e a sua forma sejam tais que o esforço seja suportado, como também para que, em caso de rompimento do tubo, o resultado não seja violento a ponto de colocar em risco a segurança do usuário.
O que acontece é que uma simples batida que cause uma trinca já pode fazer com que a estrutura perca a capacidade de resistir à pressão, e se rompa de modo violento causando uma implosão.
Dizemos "implosão" porque a força destrutiva atua de fora para dentro, com o ar atmosférico "procurando" preencher o local em que existe o vácuo.
O formato e a espessura do vidro do cinescópio em suas diversas partes são estudados justamente para obter o máximo de resistência em função do vácuo que deve existir no seu interior.
Assim, a tela, que é a parte mais crítica pela sua forma, já que deve ter uma grande superfície a mais plana possível, é de vidro mais grosso. A curvatura visa justamente dar maior resistência, daí os primeiros tipos de cinescópios serem muito curvos. Com a tecnologia moderna pode-se manter esta resistência em cinescópios que tendem cada vez mais a serem planos (como exige a reprodução fiel de uma imagem). Veja a figura 3.
O gargalo onde é instalado o canhão eletrônico ou canhões, pode ser de vidro mais fino, mas com isso torna-se mais frágil em caso de pancadas.
Porém, a parte mais frágil é a lateral na dobra da tela com o corpo do tubo. Para evitar que em caso de implosão, as partes de vidro voem de forma perigosa, esta parte é normalmente protegida por uma fita de aço. Esta fita não deve ser removida de modo algum.
De qualquer forma, deve-se ter o máximo cuidado ao trabalhar com um monitor, evitando-se qualquer tipo de pancada no cinescópio.
Os casos de implosão são muito raros, e mesmo quando um monitor cai no chão ou leva uma forte pancada, os danos mais comuns são justamente em outras partes, tais como placas de circuito impresso, que são rachadas ou quebradas ou mesmo componentes pesados que se desprendem ou quebram.
COMO DESFAZER-SE DE UM CINESCÓPIO "QUEIMADO"
Muitos técnicos que trabalham há anos com o reparo de TV e agora também com o reparo de monitores de vídeo podem acumular em suas oficinas uma quantidade "indesejável" de cinescópios queimados dos quais gostariam de se desfazer.
No entanto, com o perigo potencial de uma implosão, não se deve deixar estes tubos em qualquer parte, pois poderia haver risco de ferimentos sérios em pessoas.
O próprio ato de "jogar" o monitor no lixo já mostra que não se deve simplesmente deixar uma bomba com 10 toneladas de pressão em qualquer lugar. Deve-se levar em conta a tentação de crianças atirarem pedras nele para "ver o que acontece", ao encontrá-lo abandonado.
Existem alguns procedimentos que permitem que esta "bomba" de pressão seja desarmada, tais como os recomendados por Joroen Stessen, engenheiro da Philips:
a) Faça com uma broca fina um furo no contato de metal do anodo. O metal é fino e mole, dando passagem ao ar externo. Através deste furo o ar entra e em pouco tempo a pressão externa é contrabalançada pela pressão do ar que sai desaparecendo o perigo de explosão. O máximo que pode acontecer em caso de uma pedrada ou queda é a sua quebra.
b) Outro método é quebrar o pequeno gargalo que existe no centro do soquete por onde é feito o vácuo (como nas lâmpadas), conforme mostra a figura 4. Esta parte do cinescópio não está sujeita a pressões fortes pela sua forma e área, é bastante frágil. Remova a parte plástica do soquete e com um alicate quebre o gargalo.
CARGA ELÉTRICA
Os cinescópios de monitores de vídeo trabalham com uma alta tensão contínua que varia entre 15 000 e 35 000 volts (depende do tamanho da tela) necessária para acelerar o feixe de elétrons.
Esta alta tensão é aplicada a um eletrodo interno que reveste o cinescópio através de uma tomada denominada "chupeta" de alta tensão, de acordo com a figura 5.
Por outro lado, no lado externo do cinescópio existe um revestimento de material condutor denominado "aquadag", que é ligado ao terra do circuito de modo a atuar como blindagem.
Os dois materiais condutores e o vidro do cinescópio formam um capacitor com uma capacitância da ordem de 5 a 10 nF. Carregado com 15 000 a 30 000 volts, um capacitor com este valor pode significar um perigo potencial de choque em que tocar no tubo, mesmo com o aparelho desligado.
É por este motivo que, ao se reparar monitores de vídeo, televisores ou qualquer outro aparelho que tenha fontes de muito alta tensão (MAT) para alimentar um cinescópio, recomenda-se que antes seja feita sua descarga.
Mesmo desligado, o cinescópio pode dar um forte choque se alguém tocar nele.
A técnica de se usar uma chave de fendas para fazer a descarga, produzindo-se assim um arco e um forte estalo não é das mais recomendáveis, pois acaba por danificar a própria ferramenta.
Muito melhor é ter um circuito de descarga o qual consiste em um conjunto de resistores de 1 M em série e uma ponta de prova de alta tensão, conforme mostra a figura 6.
Com alguns megΩ de resistência, um capacitor de 5 a 10 nF precisa de pelo menos uns 5 segundos para se descarregar o suficiente de modo a não apresentar mais perigo de choques.
Mas não é apenas este ponto de um cinescópio que apresenta perigo de choques, mesmo com o aparelho desligado.
Num monitor de vídeo existem centenas de capacitores de todos os valores que trabalham com uma vasta gama de tensões.
Os mais perigosos, porque podem causar fortes choques no técnico, são os que ficam nas fontes de alimentação e que se carregam com altas tensões que podem chegar a 300 V.
Um capacitor de valor elevado, entre 50 e 100 µF que se carregue com a tensão de pico da rede de 220 V numa fonte, como a mostrada na figura 7, pode ser bastante perigoso para um técnico desavisado que toque nele.
O choque pode ser até fatal dependendo das condições em que ele ocorra.
Para descarregar os capacitores "grandes" das fontes de alimentação, é costume da maioria dos técnicos usar uma chave de fendas curtocircuitando por um instante a armadura positiva com a negativa conforme mostra a figura 8.
A forte descarga que acontece nestas condições tem dois efeitos desagradáveis e perigosos: um deles é o fortíssimo estalo que ocorre, que pode até assustar as pessoas próximas dependendo do valor do capacitor e da sua tensão de carga.
O outro é que a faísca acaba por danificar a ferramenta, marcando-a.
Mas, até o mesmo o capacitor pode ser colocado em perigo, pois a forte corrente pode causar danos no ponto em que o terminal do componente é soldado na armadura, já que é por ali que ela circula.
Muito mais recomendável é que a descarga seja feita de modo eficiente, mas suave, utilizando-se para isso um circuito como o mostrado na figura 9.
O resistor de 10 k x 1 W "suaviza" a corrente de descarga, evitando que ela seja intensa o suficiente para causar o estalo e o pico que pode danificar o próprio componente.
No entanto, como a descarga é suave, ela demora um pouco mais de tempo. A constante de tempo de um capacitor de 100 µF em série com um resistor de 10 k é de 1 segundo. Para um capacitor de 500 µF temos 5 segundos. Dobrando os tempos por medida de segurança, temos os tempos mínimos que devemos esperar para fazer a descarga de um capacitor.
TRANSFORMADOR DE ISOLAMENTO
Os circuitos dos monitores de vídeo são alimentados pela rede de energia de forma direta, sem o uso de transformadores que os isolem.
Isso significa que mesmo nos pontos alimentados por baixas tensões, o fato de haver uma conexão direta ao “vivo" da rede de energia, faz do técnico que encosta neles um retorno para a corrente observe com a ocorrência de um choque na tensão da rede, observe a figura 10.
Assim, ao trabalhar com um monitor de vídeo ligado, o técnico deve ter um duplo cuidado: com todos os pontos de baixas e médias tensões que não estão isolados da rede e que por isso podem causar um choque direto a partir da rede de energia, e com os pontos do circuito de MAT (Muito Alta Tensão) que alimentam o cinescópio.
Para trabalhar com mais segurança em um cinescópio numa bancada fazendo testes e ajustes com ele ligado, é conveniente contar com um transformador de isolamento.
Este transformador deve ter enrolamento primário e secundário para a tensão da rede de energia, e uma potência de acordo com os monitores que normalmente são reparados. Um transformador de pelo menos 300 watts é recomendado neste caso.
O leitor deve ter o máximo de cuidado para não confundir um transformador de isolamento com um autotransformador para conversão de tensão 110/220 V ou 220/110V. Num autotransformador, diferentemente do que precisamos, o enrolamento secundário é continuação do primário e não existe um isolamento entre ambos, conforme mostra a figura 11.
Uma possibilidade interessante para quem tem acesso a velhos equipamentos valvulados fora de uso, é utilizar um par destes transformadores para improvisar um bom transformador de isolamento, conforme mostra a figura 12.
O leitor deve apenas ter cuidado para que os dois transformadores usados sejam do mesmo tipo de modo que os enrolamentos de alta tensão possam ser interligados da forma indicada. Neste caso, teremos um duplo isolamento. Muitos televisores antigos (da década de 50/60) usavam transformadores deste tipo, com potências na faixa de 250 a 300 watts e que, portanto, podem ser úteis.
Uma prova de isolamento com o multímetro será importante para se garantir que o tempo não tenha feito o transformador absorver muita umidade e perder a principal característica que precisamos para seu uso: o isolamento entre os enrolamentos.
Esta prova é feita conforme mostra a figura 13.
Para um transformador que não apresente perigo de uso, a resistência medida deve ser superior a 100 k.
CONCLUSÃO
Os perigos de implosão e choque são potenciais apesar de muitas medidas de segurança que podem ser tomadas pelos fabricantes dos monitores e pelo próprio técnico. Assim, não basta trabalhar num monitor como se houvesse uma grande taça frágil de cristal no seu interior.
O técnico deve saber onde mexer e como, evitando operações perigosas e até a presença de objetos próximos que possam cair provocando acidentes.
O técnico também deve exercer sua cidadania cuidando para que, mesmo um cinescópio queimado, não venha causar acidentes. Lembramos finalmente que as substâncias empregadas na fabricação destes componentes não agridem o meio ambiente como ocorre com baterias de celulares e mesmo certos tipos de pilhas, e que eles podem ser descartados utilizando-se o serviço de coleta de lixo comum, com os devidos alertas para o tipo de objeto que está sendo manuseado e a eliminação do perigo de implosão pelos métodos sugeridos.